8 de fevereiro de 2019

O Mágico

"O vaso media cerca de um metro e vinte centímetros de alto era redondo com a forma aproximada de uma banheira, e feito de vidro excepcionalmente grosso, com mais de uma polegada de espessura. Dentro dele havia uma massa esférica, pouco maior que uma bola de futebol e de singular cor lívida. A superfície era lisa, mas de granulação um tanto grosseira, e sobre ela se estendia uma rede de vasos sanguíneos. Susie contemplava-a com indizível repugnância. De repente soltou um grito. 
– Santo Deus, isso está se mexendo!"



• "Os horrores da magia negra medieval revivem nesta novela do século XX" diz a capa de O Mágico, obra pouco citada do escritor inglês William Somerset Maugham, curiosamente inspirada pela figura de Aleister Crowley que o escritor conhecera casualmente em Paris. As circunstâncias do encontro serviram como ponto de partida do romance na efervescente vida cultural da Paris do começo do século XX, nos cafés movimentados e na vida artística em plena produtividade. Conta o escritor: "Poucos dias após minha chegada, Gerald Kelly me levou ao restaurante Le Chat Blanc, onde vários pintores costumavam jantar. Por via de regra eram as mesmas pessoas que apareciam diariamente, mas de longe em longe vinham outros. Um desses visitantes ocasionais foi Alesteir Crowley, que viera passar o inverno em Paris. Concebi uma antipatia imediata por ele, depois o homem me interessou e achei-o divertido. [...] Quando o conheci estava metido com o satanismo, magia e ocultismo. Isso era então uma espécie de moda em Paris, nascida sem dúvida, do interesse que despertava o livro de Huysmans, Là-Bas."

No livro, por intermédio de um amigo comum, os protagonistas Arthur e Margret travam contato com o misterioso Oliver Haddo, diletante de Magia Negra e Alquimia. Figura extravagante que causa desconforto e fascínio na mesma medida. Haddo interfere na vida de Arthur e sua noiva Margaret a ponto dela se deixar envolver pela misteriosa figura. E Arthur irá descobrir as horríveis experiências e tentativas do mágico em criar vida artificialmente nos sótãos de sua mansão, partindo das experiências de Paracelso!

"Os velhos alquimistas acreditavam na possibilidade da geração espontânea. Pela ação conjunta de forças físicas e estranhas essências, pretendem haver criado formas em que se manifestou a vida. Dessas formas, as mais maravilhosas eram os estranhos seres, machos e fêmeas, que se chamavam homúnculos".

Escrito em 1907, depois de O Pecado do Liza, o romance talvez seja descritivo em excesso, na linha elegante do escritor inglês, com especial espaço a desventuras amorosas, mas O Magico é uma curiosa inserção do macabro na prosa do escritor, que alcançaria definitivo êxito popular em seu romance seguinte, Servidão Humana (Of Human Bondage, 1915). O Mágico tem grandes passagens de suspense especialmente no terço final e o delírio de Margaret sob efeito dos vapores de ervas é memorável. Desenvolve lentamente sua trama e absorve o leitor de forma sorrateira justamente pela dubiedade do personagem. A narrativa cética se mantem entre o fascínio e a ridicularização de Oliver Haddo. Exatamente como era descrita a controvertida figura de Crowley por seus contemporâneos. Crowley, por sua vez, não gostou nada da referência. 

• Existe uma versão para cinema feita em 1926 com Paul Wegener (O Gólem) no papel de Oliver Haddo. Aparentemente é a única versão filmada da obra.

📚
Leitura radical
Formal demais e naturalmente preso às convenções de sua época.

Leitura passional
Pouco conhecido pelos fãs do horror e gótico. Merece uma checagem.
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O Mágico 

The Magician - William Somerset Maugham, 1908
Editora Globo - 1962
220 páginas

O Mágico

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