19 de junho de 2019

Mestre das Chamas - like father, like son!

Mestre das Chamas


Como os sacos pretos do hospital estavam acabando, teve que colocar os corpos de duas crianças dentro do mesmo saco, o que nem foi tão complicado. Elas tinham pegado fogo abraçadas e morreram fundidas numa só criatura, uma cama de gato emaranhada de ossos esturricados. Pareciam uma escultura de metal da morte.

• Bobagem querer comparar o peixe e o filho de peixe. Mas a verdade inevitável é que não há como ler Joe Hill sem pensar em Stephen King. Depois do hit O Pacto (Amaldiçoado) e do popular Estrada da Noite, este Mestre das Chamas vem para sedimentar o nome do autor como um dos mais promissores do fantástico contemporâneo.

A quantidade de páginas assusta, mas o romance tem mais a seu favor do que contra. A trama é muito consistente em suas revelações crescentes e os detalhes que a compõe, assim como os detalhes por trás de eventos são muito bem detalhados (talvez até demais). Por essa estrutura de pretensão épica (580 páginas divididas em livros internos!), o livro corre o risco de se arrastar e isso quase acontece no meio, lá pelos livros quatro e cinco. Mas passado o ótimo terço inicial e a pausa do terço central, o bloco final repete o bom nível da abertura com sequências de destruição e ainda tem uma caçada de caminhões pelas estradas! A seu modo, é um exemplar bastante representativo da cultura contemporânea em sua profusão de referências à cultura pop e verborragia nerd.

A história é sobre um mundo em vias de apocalipse e após. Um misterioso fungo chamado Escama de Dragão faz o contaminado entrar em combustão e infectar mais pessoas com as cinzas, em um crescente apocalíptico. Cidades foram varridas do mapa e aparentemente não há como controlar a epidemia. Narrando a trajetória da enfermeira Harper, Mestre das Chamas tem um ótimo início, daqueles que é "impossível largar". Os capítulos são curtos e o texto muito fluente. Mas na metade, começa a se arrastar perigosamente quando a enfermeira encontra uma comunidade alternativa na qual as pessoas aprenderam a controlar suas combustões e a converteram em uma atividade socializadora de ascensão espiritual coletiva através da música.

Quando você canta é como dar de beber a alguém que tem sede. Uma gentileza. Isso faz você brilhar. A prova de que vocês têm importância está na sua canção e na maneira como vocês se acendem uns para os outros. Os outros podem cair e pegar fogo. Mas aqui ninguém pega fogo. Aqui nós brilhamos. 

O principal sustento narrativo é o misterioso personagem do Bombeiro, figura reclusa, com poderes assombrosos e que converteu sua contaminação manipulando-a como um recurso, e até uma arma quando necessário. Ainda assim, em meio a tantas qualidades, a pretensão ao épico precisaria ter tido mais conteúdo, especialmente na parte central. Seja como for, é um trabalho notável em seu poder de envolvimento com sua narrativa linear conduzida pela enfermeira. 

O mais interessante (e assustador) é a capacidade do autor em inserir e desenvolver comentários comportamentais e sócio-políticos atualíssimos sobre estruturas supostamente civilizadas que facilmente se rompem em um momento de crise. Assim como é notável a detalhada construção do fanatismo que vai gradualmente tomando a pacífica comunidade e os grupos de extermínio que se formam pelo país afora.

🔥
Leitura Radical
Peca pelo excesso. Poderia ter sido mais sintético.
Leitura Passional
Fluente como um bom filme.
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Mestre das Chamas

The Fireman - Joe Hill, 2016
Editora Arqueiro, São Paulo, SP, 2017
580 páginas.

Mestre das Chamas

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