10 de maio de 2023

Preludio Para Matar

Profondo Rosso (Itália, 1975)

Diret Dario Argento
Com David Hemmings, Daria Nicolodi, Gabriele Lavia, Macha Meril, Eros Pagni, Clara Calamai, Giuliana Calandra, Glauco Mauri.

Profondo Rosso

Superando o modelo. Thriller clássico na escola giallo que marcou época e praticamente esgotou o gênero. Profondo Rosso, junto a Suspiria, foi o auge criativo do diretor. Tendo acumulado a experiência de sua trilogia dos bichos, O Pássaro das Plumas de Cristal, O Gato de Nove Caudas e Quatro Moscas no Veludo Cinza, Argento chegou aqui a uma forma exemplar em narrativa e domínio técnico. Se há algum deslize, são as inserções de humor nas gracinhas da então patroa do diretor, Daria Nicolodi, e o detetive, que distraem a construção de mistério e suspense.

A história básica é a mesma de incontáveis thrillers policiais, no qual uma testemunha investiga um crime por conta própria e passa a ser seguido pelo assassino. Marcus Daly, inglês, professor de piano trabalhando em Roma, presencia o ataque à sensitiva Helga Ulmann e tenta socorrê-la. Um detalhe subliminarmente percebido por ele nos corredores do apartamento pode identificar o assassino e o intrigado professor se empenha em desvendar pistas. Mas ele mora no mesmo prédio em que ocorreu o crime e será facilmente perseguido e ameaçado.

A virtude maior de Profondo Rosso (ou Deep Red em seu título alternativo) é justamente esse detalhe que fica retido no subconsciente do protagonista. Sendo assim a busca de Marcus é quase uma busca ao inconsciente, uma jornada surrealista que faz Argento brincar a vontade com a parafernália cinematográfica. Seu interesse, na confecção de uma narrativa, é sobretudo técnico, estético, em detrimento do dramático. Em um meio expressivo (o cinema) dominado por fundamentos teatrais, Argento parece ser o último futurista, fascinado pelas máquinas de filmar e editar, mais do que pelos atores. 

E em uma realidade urbana, caótica, desorientadora (a cabine telefônica no meio do trânsito), ele faz seu protagonista atravessar espaços oblíquos, sombrios, desajeitados, ou opressivos em vazios surreais. Diversas cenas remetem a arte moderna, como nos espaços de Chirico, os restaurantes de Hopper, os ângulos duvidosos de Escher, em um trabalho fotográfico que seduz hipnoticamente o olho do espectador. Além disso a montagem que alterna distâncias a "closes obscenos", como o olho maquiado, Helga babando água, cacos de vidro no pescoço, a gota de suor de Marcus, e até a agulha de um toca-discos, alternados a cenas corriqueiras de diálogos, pessoas inseridas como "mobília de cena" e os pontos de vista do assassino, criam uma leitura alternativa, um grande painel de percepção que escapa à causalidade habitual das narrativas clássicas.

Superando o modelo por ele mesmo criado nos seus três primeiros filmes, Argento redefiniu o giallo e exauriu suas forças com Profondo Rosso. Seus filmes seguintes, Suspiria e Inferno, ingressaram pelo sobrenatural e ele posteriormente entraria em um infinito ciclo de reciclagem temática no suspense, oscilando de altos geniais a baixos duvidosos.

• Melhor cena: as investigações no velho casarão art-nouveau.
• Bizarrice: o autômato que serve a distrair Giordani.
• Melhor suspense: Marcus finge distração ao piano enquanto o assassino se aproxima pelo ambiente.
• Entre diversos elogios cult, o destaque vai à trilha sonora do grupo Goblin e seus leitmotifs ensurdecedores.
• Cult: Marcus nos corredores de quadros é um ícone do terror contemporâneo.
• David Hemmings sustenta o filme com sua elegante fragilidade, em seu maior destaque de carreira, depois de Blow Up.
• A edição em VHS (em caixa de papelão da Videocast) era quase ininteligível pela cópia ruim e edição em tela cheia (4:3 da TV) que prejudicava o wide original (2.35:1).
• A edição lançada aqui em DVD (London/Works) é uma versão americana restaurada que recuperou cenas excluídas do original italiano (diálogos principalmente). E a bizarrice é que as cenas em italiano estão sem legendas em português!

Black Phillip já sabia 😈😈😈😈

Profondo Rosso
Melhor que "filme de arte", é "terror de arte". Chupa Antonioni...


David Hemmings (1941 - 2003)

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