Como uma coisa daquelas poderia acontecer? Não tinha sido minha imaginação, pois meus machucados eram reais. Havia uma presença naquela casa, alguma coisa profana; uma noção que eu antes desprezara como fantasia tomou conta de mim e me disse que aquela era de verdade. Mas havia outro fator, algo que eu não tinha cogitado antes.
Ambientado no século XIX como uma velha e boa novela vitoriana, A Casa Assombrada é simpático e muito fluente, mas tão pueril em seu desenvolvimento que pode ser entendido como uma fanfiction profissional. Conta o drama de Eliza Caine, jovem professora que acabou de perder o pai e aceita um trabalho de governanta na Gaudlin Hall, em um condado próximo a Londres, para cuidar de duas crianças. Uma vez no local, Eliza vai descobrir que nada menos do que cinco governantas anteriores, ou abandonaram a tarefa ou morreram na mansão Gaudlin! Intrigada, apesar de apavorada, ela vai se empenhar em desvendar a(s) história(s) do local e ajudar Isabelle e Eustace, as duas crianças que vivem no casarão com um mínimo de interferência adulta.
Seus cabelos estavam enrolados em cachinhos que se estendiam até seus ombros, talvez um pouco mais. Estava vestida com uma camisola branca, abotoada até o pescoço, que descia até os calcanhares; parada ali, com as velas do corredor a iluminando pelas costas, tinha uma aparência espectral que me deixou bastante apreensiva.
Correto e milimetricamente construído para referenciar um modelo clássico, A Casa Assombrada funciona como um aperitivo em fantástico literário. Divertido em sua convencionalidade e sem o mínimo esforço em alguma inovação. Cita apaixonadamente Charles Dickens logo na abertura e tem uma premissa claramente referente a A Outra Volta do Parafuso de Henry James. A narrativa é tão formal e de situações tão corriqueiras que é até possível "ver" Deborah Kerr ou Pamela Franklin circulando pelo casarão! O maior problema são as inserções de surpresas, assumidamente repetidas de inúmeras narrativas e filmes, como personagens misteriosos que somem quando a protagonista os segue, sustos arrepiantes que podem ter sido apenas pesadelos, pessoas vislumbradas rapidamente e mistérios do passado que nenhum personagem quer comentar. Exemplo rápido, na visita de Eliza à casa de chá do vilarejo:
"Sou a nova governanta de Gaudlin Hall, então devo visitar o vilarejo com frequência." No instante em que disse isso, a xícara de chá escorregou de sua mão e caiu no chão, espatifando-se em inúmeros pedaços.
Cena exemplar de qualquer suspense do gênero, nos filmes da Hammer, nos góticos em geral, e no pop de massa. Assim como essa, diversas situações similares vão compondo o livro de forma meio previsível e até enfadonha. Mas o mistério é suficiente para segurar a atenção, até o final catártico que toma a residência toda... e a reviravolta surpresinha.
Modelo manjadíssimo
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Leitura Passional
Elegância velha-guarda
A Casa Assombrada
This House Is Haunted, John Boyne, 2013
Companhia das Letras, São Paulo, SP, 2015
291 páginas
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